Ocupar possui o sentido de visibilizar, reivindicar, de dizer ‘eu ocupo porque também é meu’. No atual cenário, em que estudantes de todo o Brasil ocupam as suas próprias escolas, significa o entendimento de que a educação é um direito do povo e uma responsabilidade do Estado, tornando concreto o princípio da liberdade de manifestação e de pensamento previsto na Constituição (art 5º, IV).

escola-ocupadaE mais: é o exercício da cidadania e da plena liberdade de expressão, legítimos direitos fundamentais também garantidos pela Constituição (art. 5º IX) e previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 16, II e VI) e no Estatuto da Juventude (art. 4 e art. 16).

Assim, qualquer articulação que envolva a proteção dos direitos inerentes aos estudantes e à juventude será sempre legítima e democrática. Até porque não é novidade que o modelo de ensino adotado pelo Brasil está defasado e desgastado. Portanto, é necessário avançar na qualidade da educação criando uma base nacional comum que dê ao jovem a possibilidade do diálogo na escola para que haja um crescimento político, social e intelectual dos estudantes. Nada melhor do que serem eles, os estudantes, os próprios atores dessa mudança.

É importante lembrar que esse não é um movimento isolado como algumas mídias tentam afirmar, os secundaristas já ocupam mais de 1100 Escolas/Universidades/Institutos Federais/Núcleos Regionais de Educação, em quase todos os estados brasileiros. Com as ocupações, a juventude mostra que precisa ser ouvida, enquanto formuladores de propostas para decidir o rumo do sistema educacional.foto_1_-_escola

De outro lado, há os que querem criminalizar as ocupações e deslegitimar a luta estudantil, sobretudo porque não entendem que o espaço da escola é dos Estudantes. Os meninos e as meninas estão Ocupando o espaço que é deles por direito e trazendo para si o empoderamento necessário para que ajudem a realizar as mudanças para o ambiente escolar e que implicam em grandes benefícios para a sociedade brasileira como um todo.

Exemplos de tais criminalizações e deslegitimações são as prisões, apreensões e agressões que muitos destes estudantes têm sofrido – às vezes, até mesmo com a conivência do Poder Judiciário. Isso, sem contar a determinação de desocupação de uma escola utilizando métodos de tortura, o que é proibido pela Constituição. Afinal, não há outra palavra que possa definir isolamento físico, a privação de sono e o corte de água e energia: é tortura e ponto!

De fato, o movimento de ocupação, aqui e ali, é criticado por alguns sob a alegação de que os estudantes secundaristas estão a prejudicar terceiros, atrapalhando a vida de muitos, como, por exemplo, os quase 200 mil estudantes que fariam a prova do ENEM, se as escolas estivessem desocupadas.escola-ocupada-2

Essas alegações, porém, desconsideram que, em todo movimento de protesto, haverá aqueles grupos que não aderem à corrente de mudança e que se sentem prejudicados. Assim foi na Revolução Francesa, em que nobres e clérigos lutaram contra a queda do Absolutismo; assim foi nos movimentos que defenderam o fim da escravidão, prejudicando os interesses de muitos senhores opressores; assim foi em diversos protestos de rua que pararam o trânsito nos últimos tempos no Brasil, com pautas das mais diversas, apenas para dar alguns poucos exemplos. Eis que se pode concluir ser incorreta a tese de que um movimento é ilegítimo porque prejudica a alguns. Ora, sempre que se luta por uma causa, mesmo que justa, haverá “prejudicados”. Lembra-se, entretanto, que a manutenção do mundo como ele é (injusto) também prejudica a muitos. É por isso que se luta!

Por outro lado, em Estados de Direito como é o Brasil, certamente os governos podem tomar medidas para diminuir os prejuízos dos protestos a terceiros. No caso da prova do ENEM, por exemplo, medidas simples não foram tomadas. Em vez de transferirem os locais de prova de uma escola ocupada para outra escola não ocupada, o MEC preferiu ir para o enfrentamento político. Em termos claros: prejudicou centenas de milhares de estudantes, adiando a prova deles, apenas para desestabilizar as ocupações, com a provocação da antipatia popular pelo movimento. E, destaca-se, a postura do MEC se deu com a voz de apoio da grande mídia.

renan-lira-matos-cadais
Renan Lira Matos Cadais, Advogado.

Em contramão do entendimento da maior parte da imprensa e do próprio Poder Judiciário, algumas entidades declararam apoio aos secundaristas, dentre elas o UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), a AJD (Associação dos Juízes pela Democracia), a UBES (União Brasileira de Estudantes Secundaristas), a UNE (União Brasileira de Estudantes), e a ANPG (Associação Nacional de Pós-Graduandos), para citar somente algumas.

Certamente, as ocupações têm como finalidade demonstrar para a sociedade brasileira que a educação deve ser debatida pelos estudantes para a construção de uma sociedade “livre, justa e solidária”. Afinal, não existe melhor maneira de concretizar o direito à participação popular exaltado pela Constituição da Republica Federativa do Brasil do que o realizando na prática.

Por isso, desculpe o “transtorno”. A juventude que ocupa está ocupada, tentando mudar a educação no Brasil.

Renan Lira Matos Cadais
Advogado
OAB/ES 25.704
Representante da OAB no Conselho de Direitos Humanos
(27) 99947-2776

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your name here
Please enter your comment!