Após a polêmica divulgada pelo portal 27 (Confira Aqui), sobre o médico que deixou de atender pacientes por falta de copos, o mesmo procurou nossa equipe para confirmar o ocorrido. “Foi verdade”, explicou o Médico Marcelo Gomes.

Ele explica, porém, que parou de atender apenas os pacientes classificados como “verdes”, ou seja, que não são emergência. “São pacientes que não deveriam estar sendo atendidos na UPA e sim nas unidades de saúde. Essas unidades não funcionam como deveriam. Estamos sobrecarregados”, diz.

UPA
UPA está sempre movimentada com pacientes a espera de atendimento.

Ainda de acordo com ele, parar de atender estes pacientes por falta de copos foi uma forma de protesto. “Isso foi uma gota d’água que entornou o balde. Uma fagulha que incendiou a floresta”, afirmou dizendo que a situação da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Guarapari está insustentável.

O caso, que gerou grande repercussão na cidade, levou o médico a desmentir a Secretaria Municipal de Saúde, que havia dito, através de nota, que a falta de materiais era um caso isolado, por causa de uma demanda inesperada. “É mentira. Estava faltando copos lá há três semanas. Pode visitar qualquer unidade de saúde dos bairros que não tem copos”, diz. “Faltam remédios também”, diz mostrando uma lista com alguns remédios que estariam em falta.

De acordo com ele, faltam itens básicos como um abocate de tamanho correto, que é um material para aplicar soro e remédios nas veias dos pacientes. “Temos somente um abocate grosso. É impossível pegar algumas veias assim”, diz. A lista de problemas relatados pelo médico vai além.

Segundo ele, faltam lençóis, com pacientes deitando na maca pura, sem lençol ou deitando em lençóis cheios de sangue. Falta ainda agua oxigenada, destilada, remédios como Buscopan e itens como pó de café e açúcar. “Eu não tomo café. Mas muitos funcionários ficam até 12 horas lá sem ter o que comer. Às vezes os funcionários tem que fazer vaquinha para comprar o que comer”, diz.

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“Este ano faltou luz e o gerador não funcionou. Nessa hora chegou um paciente parado. O que quer dizer isso? Um paciente que não está com o coração batendo e nem respirando”,diz.

Ele, que trabalha no UPA desde quando era um simples PA na Praia do Morro, afirma que a situação da saúde na cidade não melhorou nada. “Está até pior”, critica.

Energia. Uma das situações contadas pelo médico é da falta de energia no UPA e consequentemente a falha de funcionamento do gerador.  “Este ano faltou luz e o gerador não funcionou. Nessa hora chegou um paciente parado. O que quer dizer isso? Um paciente que não está com o coração batendo e nem respirando. Temos que fazer massagem e entubar na respiração mecânica. E como entubar um paciente no escuro? O médico que atendeu,  entubou com a luz do celular , praticamente no escuro e não tinha luz para manter o paciente respirando através da máquina. Ele reverteu a parada cardíaca, e ficou junto com a sua equipe por cerca de três horas mantendo o paciente respirando manualmente, através de um aparelho chamado ambu, até a chegada do Samu”, afirmou.

Ambu
“Ele reverteu a parada cardíaca, e ficou junto com a sua equipe por cerca de três horas mantendo o paciente respirando manualmente até a chegada do Samu”.

As criticas do médico com a situação da UPA não param. Ele entregou ao Portal 27, várias fotos com a situação lamentável em que se encontram alguns equipamentos da saúde em Guarapari. Confira abaixo as fotos e a entrevista com o médico. 

Você não considera que foi uma atitude radical?

Foi radical, mas se a gente não fizer alguma coisa, isso vai ficar assim até quando? Se um familiar seu precisar de ir ao UPA, em um momento em que não tem luz, não tem soro, como você vai se sentir? A tendência é só piorar.  Eu mesmo já fui atendido no UPA. Precisei tomar um remédio. Eu, assim como toda população, precisamos e merecemos ser tratados com dignidade.

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Ambulância amarrada apenas com um pano improvisado.

Foi um protesto?

Foi uma forma de protesto. A população precisa conhecer como está funcionando a UPA e as unidades de saúde. Sempre é fácil culpar o médico e outros profissionais de saúde que estão lá, dizendo que não queremos atender. Existem profissionais ruins? Existem. Mas existem bons e são muitos. Pessoas boas e ruins nós temos em todos os lugares. Eu me considero um bom profissional. Se você conseguir a avaliação de algumas pessoas que já foram atendidas por mim, vai ouvir pessoas que normalmente me elogiam.

Você estava calmo ou nervoso no dia?

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“Essa foi a forma que arrumaram de transferir um paciente. Sentado na “cadeira do papai” “

Eu estava calmo. Aquilo foi à gota d’água que derrama o caldo e vi que era hora de dar um basta.  E falei com meus colegas que estavam de plantão no dia. Foi uma decisão comunicada a todos  médicos do plantão naquele dia. Nós comunicamos a enfermagem e eu pessoalmente fui comunicar aos pacientes lá fora, porque o enfermeiro não quis fazer.

Após o ocorrido, a secretaria, através de nota disse que não concordava com a sua atitude. Depois disso, você foi chamado na secretaria?

Não, ninguém. Nem a administração do UPA, nem a secretaria, nem o promotor. Ninguém.

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“Essa foi a transferência de uma gestante que eu atendi com descolamento de placenta sendo levada para Vitória sentada junto com o marido em um banquinho em uma ambulância pequena sem maca. Esse quadro em gravíssimo, com alto risco de morte para mãe e para o feto”

Você já fez alguma denuncia formal destes casos?

Já, uma vez nós os médicos, fizemos um abaixo assinado, eu tenho esse documento comigo e entregamos a secretaria de saúde, promotor, CRM, sindicato e mídia. Eu tenho esse documento assinado e recebido. O promotor me respondeu dizendo que tinha arquivado o processo porque a secretaria tinha respondido, alegando que já tinha um processo de compra dos materiais que estavam faltando. E isso foi em 2012.

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“Essa era a caixa de papelão feita para colocar os recém nascidos quando os partos eram feitos no UPA”

 

 

Respostas. Após ouvir as explicações do médico e consequentemente as suas denúncias, entramos em contato com a prefeitura para saber se poderiam responder a algumas dessas denúncias. Segue abaixo a nota completa enviada pela prefeitura.

“A Secretaria da Saúde, através da Unidade de Pronto Atendimento Dr João Batista de Almeida Neto, no Ipiranga julga improcedente as alegações do plantonista uma vez que não há ocorrência da falta de insumos e medicamentos haja visto que, quando por motivo de falta no fornecedor, é realizado o reabastecimento alternativo com outras Unidades de Saúde, não prejudicando os pacientes nem a oferta.

Nenhuma ambulância da unidade possui os problemas levantados pelo plantonistas, fato que pode ser verificado visualmente no local. Conforme é de competência do município, há disponível na UPA três ambulâncias de complexidade básica com os melhores equipamentos disponíveis, sendo estas, utilizadas para a transferência de pacientes que necessitem de cuidados especializados em outras unidades de saúde. Não é de competência do município a oferta de veículos de média e alta complexidade, ou seja, ambulância de urgência e emergência, cabendo ao Estado esta responsabilidade.

A gerência administrativa da unidade também explica que o gerador de energia passa por manutenção preventiva semanalmente. Tendo havido problema em apenas uma ocasião há 3 meses quando, por ocorrência de vários picos de energia, houve falha na alimentação de energia. A falha nesta noite foi um caso isolado e imediatamente resolvida com a presença de eletricista, não tendo havido danos a pacientes que estavam internados na unidade.

Uma vez que o plantonista alega ter realizado denúncia à Secretaria da Saúde, ao Ministério Público e ao Conselho Regional de Medicinal e “a situação continua a mesma”, entende-se que nenhum dos órgãos julga procedente as questões levantadas.

Nenhuma das reclamações do plantonista justifica a conduta em se recusar a atender aos pacientes por falta momentânea de copos descartáveis de 300ml.”

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