Fotografia: Marcelo Moryan
Fotografia: Marcelo Moryan

A Essência

Dizem que quando morrermos toda a nossa vida passa como um filme em milésimos de segundos – ainda que para nós pobres mortais seja impossível entender que nesses “milésimos de segundos” caibam tantas histórias e estórias. Evidente que não podemos afirmar, claro, pois nunca morremos – mas é crível que algo intenso acontece em outra dimensão.

O Roteiro

Meu avô era um senhor amável, mas sempre fechado em si mesmo – porém, semanas antes de ver o seu “Último Filme” já esboçava o roteiro de alguns capítulos.

Enquanto esteve internado, gostava de contar histórias de sua infância para minha mãe que o acompanhava. Sentia saudades homéricas de seus primeiros tempos neste planeta – da mesma forma, já vi centenas de casos semelhantes… Pessoas que ao morrerem, em algum tempo, antes do “Último Filme” sempre… sempre e sempre se lembram de suas infâncias enfaticamente…

O Mistério

Este fato sempre me intrigou, mas comecei a perceber que também era algo que acontecia comigo e outras pessoas quando estamos em profundo estado de tristeza… sempre nos lembramos de nossas infâncias… qual a chave desse mistério?

A Constatação

Após anos imergido nesse conflito da alma acabei por descobrir que isso tem relação com a inocência… com aqueles sonhos indestrutíveis que toda criança tem e que com o passar do tempo vão se transformando em CASTELOS DE AREIA…

A Chave

Quando morava em Marabá (PA) ganhei do nobre escritor Benedicto Monteiro um livro antigo do Poeta maranhense Raimundo Correa… (de tão antigo estava se esfarelando…), era um livro de poesias e nele encontrei a chave desse mistério que tanto havia me roubado pedaços dilacerantes de tempo… E como tampouco sou perfeito…. Ainda me roubam descaradamente… A chave estava codificada em forma de um soneto – o mais belo que já li em toda a minha vida sobre as aparências…. aparências… quem não as conhecem? Eis… nosso mal… nosso…

MAL SECRETO
Se a cólera que espuma, a dor que mora
N´alma e destrói cada ilusão que nasce,
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração, no rosto se estampasse;

Se se pudesse o espírito que chora,
Ver através a máscara da face,
Quanta gente, talvez, que inveja agora
Nos causa, então piedade nos causasse!

Quanta gente que ri, talvez, consigo
Guarda um atroz, recôndito inimigo,
Como invisível chaga cancerosa!

Quanta gente que ri, talvez, existe
Cuja ventura única consiste,
Em parecer aos outros venturosa!

As Aparências

Uma criança não se importa com as aparências… ela simplesmente “É”… Simplesmente dança com a chuva, não tem medo do fogo e está bem longe de qualquer inveja mundana – A VIDA FLUI COMO TODAS AS NASCENTES À SUA FOZ.

Talvez por isso Jesus tenha dito “Deixai vir a mim as crianças, não as impeçais, pois, o Reino dos céus pertence aos que se tornam semelhantes a elas” (Mateus 19:14) – “QUE SE TORNAM SEMELHANTES A ELAS”… Uau… fantástico!!!

Somos pouco ou quase NADA do que imaginávamos em nossos sonhos de infância – é por isso que sempre nos lembramos deles e a eles estão reservados frames especiais antes de partirmos.

Acredito muito… muito mesmo que NOSSO ÚLTIMO FILME pode ser belo, basta que olhemos para nossos SONHOS DE CRIANÇA enquanto estamos cheios de vida…. e nos espelhemos neles como ideais de sentimento pleno em cada milésimo de segundo que ainda respiramos….

EPÍLOGO

Cada Criança tem um sonho, mas essencialmente todos eles convergem em algo poderoso… e apenas isso pode transformar o mundo e as pessoas – O AMOR…. Oh! Yeahhhh!!! …. O AMOR!!!
Para os que ainda resistem em pensar que tudo não passa de uma conversa triste e fiada…. Felizmente eu ainda posso escutar alguns versos de Luís de Camões em seu Soneto:

“O tempo acaba o ano, o mês e a hora, a força, a arte, a manha, a fortaleza; O Tempo acaba a fama e a riqueza, o tempo o mesmo tempo de si chora; O Tempo busca e acaba qualquer ingratidão, qualquer dureza”.

>>A verdade é simples como a Vida…

A grande verdade é que não precisamos morrer para salvarmos alguns capítulos desse nosso “ÚLTIMO FILME”… Alguns não conseguiremos mais salvar… mas poderemos tirar lições do que se perdeu…

>>>Uma Lição que tento praticar… 

Eu tento ver o meu “ÚLTIMO FILME” em todas as minhas ações…. Sempre o repasso antes de dormir para que ao amanhecer eu o dirija de uma forma melhor… E assim quando estiver no capítulo final, obter uma classificação que esteja mais para Comédia do que Drama.

Criança brinca no Porto de São Mateus - Fotografia: Marcelo Moryan
Criança brinca no Porto de São Mateus – Fotografia: Marcelo Moryan